As pessoas não são gavetas, disseram-me um dia.
Admito que, na altura, não percebi. Fruto da minha insensatez ou pouca maturidade, demorei a perceber o sentido do ‘pó’, dos ‘papéis intactos’, da inércia envolvente. Anos mais tarde, usei a frase para mim por que me fez todo o sentido.
As pessoas não são gavetas mas os outros pensam que sim. Que é possível deixar tudo quieto, sossegado, parado, sem vida, sem memória durante muito tempo. E, depois, abrir a gaveta como se nada fosse na esperança que uma ideia, uma memória ou um coração… esteja igual.
Compartimentam, isso sim, os assuntos. Segmentam e separam. Em alguns, não mexem mais. Esses estão arrumados e mesmo destinados ao pó. Mas outros precisam de organização. Para se viver bem. Para se sorrir. Para se viver.
Tal como não é possível encontrar roupa numa gaveta desarrumada, também não se encontra nada num sítio apenas cheio de partículas de sujidade, que foi deixado ao abandono.