Saber sair.
Uma virtude maior que saber dizer ‘não’, ainda que as duas se unam.
Perceber.
Quando estamos a mais, quando a nossa presença já não faz qualquer sentido, estar ou não é igual, é banal, é hábito.
Quando o nosso amor já não significa nada, já não move nenhuma montanha, já não resolve o indecifrável, já não faz a diferença nos dias maus, aqueles em que só queremos voltar a casa.
Quando não nos procuram, não buscam nos detalhes, nas mensagens de telemóvel ou no registo das ‘chamadas efectuadas’ o nosso número até já não aparece há tantos dias.
Quando não querem o nosso abraço, não procuram o nosso refúgio, o nosso calor, o nosso fôlego, as nossas palavras.
Quando a vida já não faz sentido connosco, o futuro já não aponta para aquela direcção, o pensamento já não vai mais além.
Quando uma tarefa já não nos preenche, não nos motiva, pesa, é dor, causa muito sofrimento, mesmo que seja o sonho de uma vida.
Quando as campainhas soam, quando os alertas disparam e nós ignoramos, ignoramos e voltamos a ignorar.
Até ao dia em que o Mundo cai, o corpo cede e a mente não ajuda.
Deixa ir. Entregar. A lucidez.
Quando é preciso saber sair antes do fim.
Perceber que uma vida, uma tarefa, um ciclo acabou. É, provavelmente, das questões mais aterradoras, para mim.
Respirar, levantar a cabeça e seguir, qualquer que seja o destino, qualquer que seja a previsão, não importa o caminho. Importa é a certeza, a fé de que tudo começa e acaba. Menos o amor, que tudo pode. Mas não chega.
Pelo que refere, fica também a grande constatação de que saber sair é parte importante do saber (re)entrarmos em cada um de nós, saber sabermo-nos, e olhar em frente com a disponibilidade de ver o passado como algo de bom, independentemente daquilo que possa ter acontecido.